O nosso país foi o último das Américas a abolir à escravidão que por aqui durou mais de três séculos. Mesmo com a pressão externa de outras potencias mundiais, como a Inglaterra que pretendia expandir suas manufaturas para o “novo” mercado consumidor nas Américas, o tráfico de escravos continuou sendo fonte de riquezas no Brasil Imperial já independente de Portugal. A República ainda seria “proclamada” pouco mais de um ano depois da Abolição, mas as agitações internas do Segundo Reinado, com diversas revoltas e revoluções como a Baianada, a Farroupilha e a Praieira, vinham corroendo internamente a unidade da grandiosa “Nação tupiniquim”. A Guerra do Paraguai fortaleceu o Exército Brasileiro, porém era o modo de produção escravista que mantinha as elites interligadas e o domínio sobre a população brasileira continuava nas mãos dos grandes latifundiários e detentores de terras.
Portanto, A Festa do 13 de Maio que é uma tradição centenária em Paraisópolis (MG), reatualiza a importância histórica da assinatura da Lei Áurea em 13 de Maio de 1888 marcando formalmente a Abolição da Escravidão no Brasil e que foi assinada pela Princesa Isabel durante o Segundo Reinado do Brasil Império. Tal celebração como conhecemos ainda hoje, foi oficializada a partir de 1934 com a coroação da primeira rainha “branca” e passa a acontecer na região central da cidade. A partir de 1964, com a Fundação do Clube Rosa de Ouro, a Festa do 13 de Maio incluiu em seu cerimonial este espaço fundamental para a memória dos processos de resistência, luta e sociabilidade da população negra local.
Hoje, porém, jovens historiadores locais, informados com novas perspectivas históricas que consideram a memória como fontes de pesquisa, têm trazido à tona dados históricos relativos e anteriores à 1934, desconhecidos da maioria dos paraisopolenses. Fontes estas que relatam já nos anos que se seguiram à Abolição, uma celebração organizada pela comunidade negra todo mês de maio na Rua Santos Dumont, no Bairro Bambuíra. Até 1933, um dado nos chama atenção durante as entrevistas com a Dona “Ditinha Angeli”, neta de ex escravos e filha dos primeiros festeiros: todas as rainhas escolhidas em homenagem à Princesa Isabel eram da comunidade negra. No limite, podemos dizer que a Festa do 13 de Maio começou no exato dia da Abolição. No local onde é hoje o Mercado Municipal e onde havia uma Senzala que vendia escravos, houve no dia da abolição um festejo no momento em que os negros receberam a notícia que a partir daquele dia estavam livres dos terrores do sistema escravagista.
O festejo daquele dia transformou-se nos anos seguintes em festa. Nesta festa, os presentes organizados em roda ouviam um relato sobre os tempos da escravidão, alimentos eram compartilhados, a valsa era dançada e uma Rainha Negra era coroada. Não é o caso de relativizar o que se passou depois de 1934, quando a Festa do 13 de Maio entrou para o calendário oficial do município e uma rainha branca, em homenagem à Princesa Isabel, passou a ser coroada. Mas o que pretendemos com o documentário é senão compreender o contexto histórico de luta e resistência negra que soube conduzir à festa da Bambuíra ao Centro, sem perder o protagonismo negro na organização deste evento.
É esta história que o documentário “A Rainha Negra”, com recursos da Lei Paulo Gustavo, resgatará. Em breve, mais informações sobre “A Rainha Negra”, que trará uma perspectiva inédita sobre o 13 de Maio em Paraisópolis (MG). Produzido por Ana Carla Pinheiro, José Geraldo, Rodrigo Mendes e Mateus Cursino, o documentário conta com entrevistas e imagens da festa e já está sendo filmado e roteirizado para ser exibido no segundo semestre de 2024 durante a “Mostra de Cinema Paraíso”.