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PL 1904: como queimar mulheres na fogueira da lei

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Mês de junho, época das festas Juninas de Santo Antônio, São Pedro e São João, com suas fogueiras, quentão e quadrilhas. Haverá alguma relação dessas festas com um retorno à Idade Média, ainda que simbólico, de imolar mulheres nas fogueiras, acusadas de serem bruxas? Não sei… Mas sabemos que há, sim, uma certa analogia entre Idade Mídia (hoje) e Idade Média, mais do que imaginamos.

Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, como um Nero desvairado, vai tocando fogo em Brasília ao propor urgência no Projeto de Lei 1904/24, de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante, que equipara o aborto após a 22ª semana ao crime de homicídio, penalizando absurdamente as mulheres vítimas de estupro, que se engravidam e querem abortar. Ao considerar as vítimas de estupro que querem abortar pra não ter um filho de um estuprador, como homicidas, e que elas (geralmente adolescentes, jovens) devem cumprir uma pena de até o dobro da cumprida pelo estuprador, no mínimo, simbolicamente, nosso Nero tupiniquim quer “queimar as mulheres” na fogueira da lei.

Ainda que tenha que passar pelo Senado e, logicamente, por modificações, depois de apreciada e discutida pelas senadoras (mais do que apenas pelos senadores homens), sem urgência e com calma, com profundidade, essa lei a ser posssivelmente implementada, como na época da inquisição, partiu de um homem, claro, ligado à religião, um deputado da chamada bancada da Bíblia, de nome também bíblico: Sóstenes. Nas páginas do Novo Testamento, o outro Sóstenes foi espancado por uma multidão por ter acusado o apóstolo Paulo de cultuar a Deus de forma contrária à lei (seria fake news daquela época, verdade ou mentira mesmo?). O Sóstenes de hoje também tem sido “espancado” nas mídias e não é sem razão, concordam? Por que punir uma vítima (mulher) com o dobro da pena do agressor estuprador? Misoginia?

Já vou deixar registrado que, nesses tempos de verdades relativas e mentiras absolutas, não sei se é claríssimo que foi a Lispector que afirmou que “se a Idade Média voltar, eu estou do lado das bruxas”, mas eu (e todo mundo) estaremos e estamos do lado delas!

E tem outra coisa: se nós, homens, os que, geralmente, fazemos as leis, engravidássemos, creio que jamais o aborto seria crime. E se assim fosse desde a Idade Média creio também que fogueiras seriam proibidas e hoje não teríamos festas juninas com fogueiras.

Aerton Sina é professor de Literatura, poeta de gaveta, eterno amante de vários idiomas e vive divagando, no mundo da lua (talvez seja um astronauta e nem saiba disso).

O texto não reflete precisamente a opinião do blog.

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